Isabel de Aragão foi muito mais do que rainha consorte. Dotada de um profundo sentido de justiça social e solidariedade com os pobres, a isso se deve ter sido canonizada pela Igreja Católica. À luz da ciência, a explicação para as curas que operou deve-se ao facto de Isabel conhecer o poder curativo das plantas e ter estudado a anatomia do corpo. O novo romance da ex-jornalista Isabel Machado recria a personagem da primeira rainha de Portugal que não abdicou de ter um papel nos assuntos de Estado
Se Isabel Machado, a autora de “A Rainha Santa”, considera Dinis de Portugal e Isabel de Aragão como o “mais interessante casal real” da história do nosso país, a história mostra que formaram uma boa parceria na governação do reino. É preciso recuar ao século XIII, à constante ameaça às frágeis fronteiras dos reinos da Península Ibérica para entender a importância de uma criteriosa política de alianças entre casas reais. Nesse tempo, como nos séculos vindouros, a diplomacia matrimonial firmava pactos entre Estados, e a noção de amor era alheia aos casamentos de príncipes e princesas, educados desde a nascença para defender os interesses do reino que os vira nascer.
Isabel Machado trocou o jornalismo pelo romance histórico, ou seja a narrativa dos factos concretos pela ficção de personagens, diálogos e alguns acontecimentos. Como ela própria diz, o “o romance histórico é ficção”, não é um relato que tenha de ser sempre fiel às fontes. Mas para que o romance tenha corpo, consistência, credibilidade, “é preciso investigar os elementos disponíveis sobre a época, personagens e ambientes. Na altura da pesquisa trabalho 12 horas por dia, sete dias por semana”, disse ao Expresso a autora do livro “A Rainha Santa”, que é apresentado esta terça-feira ao fim da tarde na livraria FNAC do Colombo.
Sobrinha-neta de Santa Isabel da Hungria – cujo milagre mais conhecido é o das rosas que muitos atribuem por mimese a Isabel de Aragão – a filha de Pedro III de Aragão tinha 12 anos quando casou com Dinis de Portugal, selando assim uma aliança dos dois reinos peninsulares contra a ameaça hegemónica de Castela. Pia e devota, a jovem princesa sentia ter recebido de Deus e da sua Santa tia [já canonizada] “a missão de se dar aos mais carenciados de todos, em plena entrega, tocando-lhes e tratando-os no exemplo de aceitação plena de Cristo, sem julgamento”. Muito jovem, e ainda solteira, tinha o hábito de visitar asilos e hospitais, o que constituía uma enorme preocupação para seu pai.
Em termos de saber, Isabel beneficia da imensa curiosidade do seu irmão Jaime [II de Aragão] que se dedica ao estudo dos poderes curativos das plantas e da anatomia do corpo. O príncipe Jaime usufruíra da proximidade com os melhores físicos [os nossos médicos] da época – judeus ou árabes residentes na Península; entre os seus educadores ilustres, contou com o notável filósofo, doutor e poeta Ramon Llull – criador da doutrina do racionalismo místico que seria condenada pelo Papa Gregório XI um século depois e considerada como desvio apóstata.
A proximidade de Isabel com o seu irmão Jaime coloca-a no mundo próximo dos mais importantes debates teológicos e filosóficos do seu tempo, sendo ela que introduz em Portugal o culto do Espírito Santo, cujos festejos se celebram nos nossos dias [este aspeto não é abordado no romance de Machado].
Já em Portugal, Isabel “vai perceber que tem um outro caminho a fazer durante o seu tempo de vida: a paz”, diz a autora ao Expresso, salientando que considera este um dos maiores legados da Rainha Santa a par da criação de casas de abrigo para as prostitutas velhas e doentes, mulheres proscritas por toda a sociedade.
A mulher do rei poeta nunca abdicou da intervenção política e manteve uma correspondência regular com o seu irmão dileto, Jaime II de Aragão, convencendo-o “a ir em pessoa encontrar-se com o rei de Castela, com quem estava em guerra havia anos por causa de Múrcia, com mediação do rei D. Dinis. Foi um acontecimento enorme na História da Península, e reuniu os Reis de Portugal, Castela e Aragão”.
Interveio junto do rei de Castela que era casado com uma filha do casal real português; “a paz entre Aragão e Castela foi conseguida em 1304, com influência direta de D. Isabel”, diz a autora que neste livro procura recriar algumas facetas menos conhecidas da Rainha Santa.
ISABEL DE ARAGÃO |
Cultos, senhores de forte personalidade e determinação, Dinis e Isabel formaram a melhor dupla real da primeira dinastia do reino de Portugal. Mas nem sempre estiveram de acordo nos interesses que defenderam, nomeadamente quando a Rainha pressentiu que Afonso Sanches, bastardo real, poderia disputar a coroa ao legítimo herdeiro que a história batizaria de Afonso IV.
http://expresso.sapo.pt/cultura/2016-09-27-A-Rainha-Santa-sabia-de-ervas-de-unguentos.-Se-fosse-hoje-seria-medica
Associação dos Autarcas Monárquicos
SETEMBRO DE 2016
CARMINDA NEVES
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